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Textos e Contextos
do Orientalismo Português

António de Almeida (Sezures, 1900 – Lisboa, 1984)

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Distinguindo-se como antropólogo, António de Almeida iniciou o curso de licenciatura em Medicina na Universidade de Coimbra, concluindo-o, porém, na Universidade de Lisboa, em 1929. Entre 1928 e 1931 terá sido médico assistente na Faculdade de Medicina de Lisboa, passando, em 1931, a exercer as funções de médico e de professor no Liceu Normal (atual Pedro Nunes).

Após tirar uma pós-graduação na Escola de Medicina Tropical e na Escola Superior Colonial, em cuja reforma participou em 1930, António de Almeida formou-se em Antropologia pela Faculdade de Ciências de Lisboa. Em 1934, tornou-se bolseiro da Junta de Educação Nacional, o que lhe permitiu fazer investigação antropológica em Angola, e, posteriormente, da instituição que lhe sucedeu, o Instituto para a Alta Cultura. Rapidamente entrou na carreira académica como docente na Escola Superior Colonial, mais tarde Instituto Superior de Estudos Ultramarinos (1954) e, depois, Instituto Superior de Ciências Sociais e Política Ultramarina (1961), tornando-se professor interino em 1935 e ascendendo a catedrático em 1938. Lecionou sobretudo Etnologia e Etnografia do Ultramar Português e Antropobiologia. Jubilou-se em agosto de 1970.

Foi diretor do Centro de Estudos de Etnologia do Ultramar, fundado em 1954 pelo Instituto Superior de Estudos Ultramarinos e sob o patrocínio da Junta de Investigações do Ultramar. A partir de 1962, o Centro passou a ser designado como Centro de Estudos de Antropobiologia, no qual António de Almeida manteve as suas funções diretivas. Paralelamente, exercia o cargo de diretor do Museu Etnográfico da Sociedade de Geografia de Lisboa, da qual era sócio ordinário desde 1921, com o número de registo 8985, participando nas suas atividades e publicando no seu Boletim . Veio a ser (quarto) secretário perpétuo da Sociedade, a partir de 16 de dezembro de 1963, após entrar para a sua direção em 1936 e servir como secretário-geral de, pelo menos, 1960 a 1963.

Foi um dos principais representantes da Escola de Antropologia do Porto, fundada em 1920 por Mendes Correia (1888-1960), que formou a Sociedade Portuguesa de Antropologia e Etnologia (1918), de que António de Almeida foi membro. Entre 1948 e 1954, António de Almeida pertenceu, ao lado de Mendes Correia, à comissão diretiva do periódico Estudos Coloniais: revista da Escola Superior Colonial, o qual, entre 1955 e 1963, passou a designar-se Estudos Ultramarinos: revista do Instituto Superior de Estudos Ultramarinos, juntando-se António da Silva Rego à direção.

Criada em 1936, a Junta das Missões Geográficas e Investigações Coloniais – mais tarde denominada Junta de Investigações do Ultramar e, a partir de 1982, Instituto de Investigação Científica Tropical – financiou expedições e missões científicas nas colónias portuguesas. Enquanto membro da Junta, e tendo em 1948-1949 desenvolvido trabalho de campo em Angola, a António de Almeida foi confiada a chefia das campanhas da Missão Antropológica de Angola (1950, 1952 e 1955) e foi em 1954 adjunto da Missão Científica de São Tomé. Não circunscreveu, porém, a sua pesquisa a estes espaços; estendeu-a a Guiné (1959, 1962), Cabo Verde (1962), Moçambique (1959), à Índia Portuguesa (1960, 1961), a Macau (1966) e Timor. A partir de 1953, chefiou a Missão Antropológica de Timor, no âmbito da qual fez diversas expedições (1953, 1954, 1957, 1963, 1964, 1966, 1968, 1969, 1974 e 1975), em que colaborou com investigadores como Mendes Correia, Ruy Cinatti (filho de Demétrio Cinatti), o etnólogo e geólogo francês Abbé Henri Breuil (1877-1961), o linguista sul-africano Ernst Oswald Johannes Westphal (1919-1990) ou Georges Zbyszewski (1909-1999). O material etnográfico, etnolinguístico e também arqueológico que colecionou veio enriquecer o Museu de Etnologia, criado em 1965, e o Museu da Sociedade de Geografia.

Parte do material recolhido foi editado a posteriori e exibido sob a forma de filme em diferentes ocasiões. Uma delas foi a do XXIV Congresso Internacional de Orientalistas, que decorreu em Munique, no ano de 1957, onde o antropólogo – único participante português – apresentou o documentário Arts et Métiers du Timor. Como o título indica, e de acordo com o resumo publicado nas atas do evento, o filme retrataria as artes e os ofícios dos timorenses no seu quotidiano, nomeadamente a olaria, a produção de joias, o fabrico de objetos decorativos e utilitários em latão e argila, a produção de têxteis, a fabricação de sal e a construção de habitações, evidenciando, assim, preocupações que vão muito além da tradicional antropologia física e privilegiam a cultura material. À exibição do filme ter-se-á seguido a sua discussão por Jeanne Cuisinier (1890-1964), etnóloga francesa, e Theodoor Gautier Thomas Pigeaud (1899-1988), especialista em literatura javanesa. O documentário ter-se-á destinado apenas a circuitos científicos, não existindo registo de ter sido exibido na Rádio e Televisão de Portugal.

Artes e Ofícios de Timor faria possivelmente parte da série de filmes etnográficos “Reconstrução de Timor” (Corral 2015, 104), focados no desenvolvimento do país após a Segunda Guerra Mundial, a qual integra outros títulos como Caça e Pesca em Timor, Danças e Jogos ou Danças de Timor. Segundo Maria do Carmo Piçarra (2017, 145), realizaram-se, no total, 16 filmes no âmbito da Missão Antropológica de Timor, alguns com e outros sem som, sugerindo a investigadora que os sonorizados seriam usados para fins propagandísticos enquanto os não sonorizados – como se supõe ser o caso do filme apresentado ao Congresso Internacional de Orientalistas – cumpririam um propósito mais científico. A proximidade entre a narrativa visual de algumas sequências fílmicas sonorizadas da série Missão Antropológica de Timor, disponibilizadas através do Centro Audiovisual Max Stahl Timor-Leste, e o resumo do documentário oferecido ao Congresso de Munique faz-nos crer que este possa ter consistido numa seleção de sequências inicialmente sonorizadas, das quais o som terá sido removido para respetiva apresentação junto da comunidade internacional, e até mesmo para dispensar custos com legendagem.

Das publicações de António de Almeida, escritas tanto para o grande público como para um público mais especializado, ressalta a preocupação com a diversidade étnico-linguística e com as práticas socioculturais dos vários povos que então compunham o Ultramar Português. Se, por um lado, o seu trabalho marcou a antropologia colonial feita em Portugal, por outro António de Almeida preocupou-se quer com o estado do ensino colonial, fazendo propostas com vista à reforma da instrução ultramarina, quer com a sua articulação com a política de administração colonial.

Os trabalhos de António de Almeida encontram-se sobretudo na biblioteca do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade de Lisboa e na da Faculdade de Letras de Lisboa, no fundo particular do Professor Jorge Borges de Macedo.

 

Bibliografia selecionada do autor

1942. Política Colonial Portuguesa no Passado e no Presente. Lisboa: Tip. Bertrand.
1945. Representação permanente dos interêsses das colónias na metrópole. Boletim Geral das Colónias XXI (239): 182-185.
1959. Arts et métiers du Timor [resumo]. In Akten des Vierundzwanzigsten Internationalen Orientalisten-Kongresses München. 28. August bis 4. September 1957. Wiesbaden: Deutsche Morgenländische Gesellschaft E.V., 698-700.
1959. Notas sobre Artes e Ofícios de Nativos de Timor Português. Sep. Garcia de Orta 7 (3). Lisboa: Junta das Missões Geográficas e de Investigações do Ultramar.
1961. Timor e Alguns Confrontos Etnográficos. Sep. Boletim do Instituto Vasco da Gama 80. Bastorá: [s.n.].
1962. Alguns Aspectos da Ocupação Científica dos Territórios do Ultramar. Sep. Boletim da Academia das Ciências 34. Lisboa: [s.n.].
1967. Os Povos Actuais do Oriente Português. Lisboa: Instituto Superior de Ciências
1972. Da Antropologia Física Ultramarina de “Os Lusíadas”. Lisboa: Junta de Investigações do Ultramar.
1976. Presenças Etnobotânicas Brasileiras no Timor Português. Lisboa: Tip. Império.
1994. O Oriente de Expressão Portuguesa. Lisboa: Fundação Oriente/Centro de Estudos Orientais.
 
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última atualização em outubro de 2019