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Textos e Contextos
do Orientalismo Português

Sebastião Rodolfo Dalgado (Assagão, 1855 – Lisboa, 1922)

Sebastião Rodolfo Dalgado
© 1934. Revista da Faculdade de Letras 1 (1-2).
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Membro de uma família católica de origem brâmane, Sebastião Rodolfo Dalgado licenciou-se em Teologia, no Colégio de Estudos Eclesiásticos de Rachol, onde aprendeu as línguas clássicas (Latim, Grego e Hebraico). Foi ordenado padre em 1881 e, mais tarde, doutorou-se em Direito Canónico e Direito Romano na Universidade de Santo Apolinário, em Roma. A 11 de outubro de 1884, foi designado Capelão Honorário, pelo Papa Leão XIII, sendo-lhe atribuído o título de Monsenhor, pelo qual ficará conhecido. Um mês depois foi nomeado, em Lisboa, Missionário da Coroa Portuguesa na Índia. De regresso à Índia em abril de 1885, foi nomeado e eleito para diversos cargos, de que destacamos o de Vigário-Geral em Calcutá (Bengala), em maio de 1887, o qual manteve até abril de 1890. Em Calcutá, deu continuidade ao seu estudo das línguas asiáticas, familiarizando-se com o Hindustano e o Bengali. Ali terá fundado uma escola para raparigas e um dispensário para os pobres. Entre 1890 e 1893, viveu em Savantvadi e investiu no estudo das línguas marata e sânscrita. Os conhecimentos linguísticos que vinha acumulando serviram o seu Dicionário de Concani-Português, produzido neste período (Bombaim, 1893).

Em 1895, mudou-se para Lisboa, onde se dedicou à Filologia e à Lexicologia (sobretudo asiática e luso-oriental), sobressaindo pelo seu trabalho em torno dos crioulos indo-portugueses e das línguas concani e sânscrita, assim como da influência da língua portuguesa na Ásia. Em 1907, sucedeu a Vasconcelos Abreu no magistério da língua sânscrita, que assegurou entre 1907/1908 e 1921/1922. Mariano José Luís de Gonzaga Saldanha (1878-1975) sucedeu-lhe no ensino dessa língua, a qual chegou a lecionar no Instituto de Línguas Africanas e Orientais da Escola Superior Colonial entre 1946 e 1948.

Em 1892, encontrando-se ainda na Índia, e conforme dá conta no preâmbulo a Dialeto Indo-Português de Ceilão (1900), Dalgado terá enviado a um amigo, identificado como Monsenhor Francisco Cordeiro, um texto para ser lido no Congresso Internacional de Orientalistas, que iria realizar-se em Lisboa. A memória, intitulada “Influência da língua portuguesa no Oriente”, nunca conheceu a luz do dia: por um lado, o congresso foi desconvocado de véspera, pelo que não chegou a ser apresentada; por outro, o texto não terá sido impresso. A memória compreenderia um estudo sucinto dos crioulos indo-portugueses, em particular o de Ceilão, bem como uma lista de vocábulos portugueses presentes em línguas indianas. No mesmo preâmbulo, Dalgado confessa, porém, que, “[m]algrado o Congresso, não me importei com a memória senão para ampliar a lista com novas línguas e mais vocábulos” (1900: x). Tal declaração leva-nos a encontrar em Influência do Vocabulário Português em Línguas Asiáticas (1913) uma versão desenvolvida da memória preparada para o Congresso. Impresso com o apoio da Academia das Ciências, o estudo é dedicado ao filólogo Gonçalves Viana e beneficiou, entre outros, do trabalho do historiador japonês Murakami Naojirō (1868-1966), nomeadamente do seu The Influence of Early Intercourse with Europe on the Japanese Language (Tóquio, 1906). A Influência do Vocabulário Português em Línguas Asiáticas teve, em 1936, tradução para inglês pela mão de Anthony Xavier Soares, professor do Baroda College, na Índia.

Além de manter contacto regular com Murakami, entre, pelo menos, 1915 e 1920, Dalgado trocou ativamente correspondência com o linguista alemão Hugo Schuchardt (1842-1927), cujo trabalho Die Sprache der Saramakkanneger in Surinam (1914) foi proveitoso para o seu estudo sobre os crioulos de Ceilão, Bombaim, Damão e Negapatão. Dalgado ofereceu-lhe um exemplar da sua obra mais icónica, Glossário Luso-Asiático, publicada em dois volumes (1919 e 1921) e dedicada a José Leite de Vasconcelos.

Sebastião Dalgado foi membro ordinário da Sociedade de Geografia de Lisboa (1896); membro do Instituto de Coimbra (1896), de que se tornou correspondente nacional em 1898; membro da Royal Asiatic Society de Londres (1921); e sócio correspondente da Academia das Ciências de Lisboa, em cujo boletim publicou assiduamente. Foi votado por unanimidade como sócio desta Academia a 27 de julho de 1911, por proposta de Gonçalves Viana, em reconhecimento do seu Dicionário Português-Concani (1905), o qual foi impresso a expensas do Ministério da Marinha e Ultramar.

O espólio de Monsenhor Dalgado foi legado por testamento à Academia das Ciências de Lisboa, onde pode ser consultado. Em 1988, criou-se, em sua homenagem, o Dalgado Konknni Akademi, em Pagim, destinado a promover o estudo e uso da língua concani.

 

Ver também Dicionário de Orientalistas de Língua Portuguesa,
https://orientalistasdelinguaportuguesa.wordpress.com/sebastiao-rodolfo-dalgado/

 

Bibliografia selecionada do autor

1893. Diccionario Komkani-Portuguez Philologico-Etymologico, composto no alphabeto devanâgarî com a transliteração segundo o systema jonesiano. Bombaim: Typographia do Indu-Prakash. Disponível em http://purl.pt/20844/1/index.html#/1/html.
1897. Hitopadexa ou Instrucção UtilVersão portugueza feita directamente do original sanskrito. Introdução de G. de Vasconcelos Abreu. Lisboa: Antiga Casa Bertrand.
1900. Dialecto Indo-Português de Ceylão. Contribuições da Sociedade de Geografia de Lisboa para o quarto centenário do descobrimento do caminho marítimo para a Índia. Lisboa: Imprensa Nacional. Disponível em https://archive.org/details/dialectoindoport00dalguoft.
1900-1906. Dialecto Indo-Português de Goa; Dialecto Indo-Português do Norte. Lisboa: Imprensa Nacional/Porto: Typographia de A.F. Vasconcellos.
1905. Diccionario Portuguez-Koṁkaṇî. Lisboa: Imprensa Nacional. Disponível em https://archive.org/details/diccionarioport00dalggoog.
1913. Influência do Vocabulário Português em Línguas Asiáticas: abrangendo cerca de cinquenta idiomas. Coimbra: Imprensa da Universidade.
1916. História de Nala e Damayanti: episódio do Mahabhárata. Coimbra: Imprensa da Universidade.
1917. Dialecto Indo-Português de Negapalão. Porto: Tipografia Sequeira.
1919-1921. Glossário Luso-Asiático, 2 vols. Coimbra: Imprensa da Universidade. Disponível em https://archive.org/details/glossriolusoas00dalguoft.


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última atualização (MPP) em setembro 2022